Considerada, no passado, um procedimento de exceção e indicada apenas em situações de risco de morte para gestantes, as cesarianas realizadas hoje no país têm percentual elevado: enquanto a Organização Mundial da Saúde (OMS) preconiza como ideal uma taxa entre 10% e 15%, o Brasil apresenta números que superam os 35%, chegando aos 70% quando se considera somente o serviço privado. Com base nesses dados, pesquisadores da Universidade Federal do Maranhão analisaram aspectos relacionados à escolha do tipo de parto em duas maternidades, uma do serviço público e outra do privado, em São Luís, capital do Maranhão. Publicados na última edição da revista Cadernos de Saúde Pública da Fiocruz, os resultados apontaram que 79,1% das mulheres consultadas na maternidade pública preferiam o parto vaginal, embora 46% das gestantes tenham realizado parto cesáreo. Na maternidade privada, a preferência era oposta: 67,4% das mulheres analisadas gostariam de fazer cesarianas e 97,8% das gestantes realizaram o procedimento cirúrgico.
Segundo a pesquisa em São Luís (MA), na maternidade privada, 67,4% das mulheres gostariam de fazer cesarianas e 97,8% das gestantes realizaram este procedimento cirúrgico (Foto: Ana Limp/CCS)
“A ‘medicalização’ do parto, ou seja, a mudança de assistência baseada na plausível segurança dos procedimentos médicos intervencionistas, transformou o parto normal em um parto passível de risco”, afirmam os pesquisadores no artigo. “A tecnologia médica se apresenta, nesse sentido, como uma resposta necessária para o controle desse risco, justificando a legitimação social do parto cesáreo como um procedimento seguro, indolor, moderno e ideal para qualquer grávida, adaptando-o para que se insira na orientação geral da medicina ocidental de beneficência (poupar a mulher da dor)”.
Para o estudo, foram avaliadas, durante os meses de fevereiro e março de 2007, 163 gestantes na maternidade pública e, em abril e maio do mesmo ano, 89 grávidas na maternidade privada. Em ambas as localidades, o principal motivo alegado para a preferência pelo parto vaginal foi a recuperação mais rápida. Para as mulheres que optariam pelo parto cesáreo, o motivo mais frequentemente apontado foi o medo de sentir dor. “As altas taxas de cesarianas são particularmente preocupantes porque implicam alta probabilidade de futuras cesarianas, pois, na prática, uma cesariana prévia constitui indicação quase absoluta para nova cesárea”, comentam os autores.
Segundo os pesquisadores, as taxas de concordância entre a preferência da gestante e o tipo de parto realizado na maternidade pública foram de 55% para o parto vaginal e 38,2% para o cesáreo, percentuais que sugerem que o desejo da mulher teve importância menor, prevalecendo as indicações clínicas para cada via de parto. “Na maternidade privada, as taxas de concordância foram de 6,9% para o parto vaginal e 100% para o parto cesáreo”, contam os pesquisdores. Além disso, destaca-se que a intenção de repetir a via de parto se mostrou muito mais frequente entre as mulheres que tiveram parto vaginal, em ambos os serviços.
No que se refere a indicações clínicas para a realização da cirurgia cesariana, encontrou-se a necessidade em 94,7% das gestantes que fizeram esse procedimento na maternidade pública. No caso da maternidade privada, em apenas 63,2% dos casos havia registrode uma indicação clínica no prontuário. “Para as demais gestantes da maternidade privada que realizaram cesariana não havia documentação de indicação da cirurgia, ficando esclarecido que foi ‘a pedido’, com base na informação da parturiente durante a entrevista no pós-parto”, esclarecem os pesquisadores.
No mais, tanto na maternidade pública quanto na privada, a maioria das gestantes relatou ter recebido assistência pré-natal sem diferenças estatisticamente significantes e essa assistência foi considera completa pelos pesquisadores em 57% das mulheres na instituição pública e em 97,8% das da privada. “A assistência pré-natal tem sido apontada como um fator de redução do risco de complicações e da necessidade de cesariana”, dizem os autores. “No presente trabalho, no entanto, a despeito de a quase totalidade das parturientes ter recebido tal assistência, observaram-se altas taxas de cesarianas”.
Os pesquisadores ainda alertam que as cesáreas acarretam aumento da morbimortalidade materna e neonatal, destacando-se entre as causas a infecção e a prematuridade; associam-se a retardo na recuperação da parturiente e a maior tempo de internação e de assistência por profissionais de saúde; levam ao maior uso de medicamentos e ao início tardio da amamentação; e, por fim, elevam os gastos para o sistema de saúde. “Parece que o incremento das cesarianas não se deve apenas a questões médicas, sendo influenciado por outros fatores relacionados à gestante, como as desigualdades socioeconômicas”, explicam.
Publicado em 24/07/2009.
Fonte Agencia Fiocruz de Noticias
Para ler o artigo científico original, clique aqui http://www.fiocruz.br/ccs/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=2741&sid=9
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