Pesquisa revela que adolescentes são mais vulneráveis à infecção por HPV associada ao câncer de colo do útero
Roberta Monteiro
Uma pesquisa realizada na Fiocruz revela que um ano após o início da vida sexual, quase uma em cada quatro adolescentes já apresenta lesões causadas por papiloma vírus humano (HPV), com probabilidade de alcançar 40% em cinco anos de vida sexual. O levantamento foi feito pela ginecologista Denise Monteiro, doutora em Saúde da Criança e da Mulher pelo Instituto Fernandes Figueira (IFF), unidade da Fiocruz, e alerta para os cuidados especiais que devem ser dedicados a esta faixa etária.
O colo do útero é o segundo local mais comum de instalação do câncer entre as mulheres a nível mundial. A cada ano, ocorrem aproximadamente 510 mil novos casos da doença, com 288 mil óbitos por ano em todo o mundo. O diagnóstico é simples e pode ser realizado em exames ginecológicos de rotina.
Estudo acompanhou jovens nos primeiros anos de vida sexual
Denise Monteiro investigou os atendimentos no Serviço de Ginecologia para Adolescentes do Hospital de Jacarepaguá, instituição pública na cidade do Rio de Janeiro, pertencente ao Ministério da Saúde, onde a autora coordena o Setor de Ginecologia para Adolescentes desde a sua criação, em 1993.
Entre 1993 e 2006, Denise acompanhou 403 adolescentes durante cinco anos após o início da atividade sexual, das quais 147 apresentaram alterações citológicas. Do total de adolescentes acompanhadas, 113 apresentaram lesões intraepiteliais de baixo grau. Em 12 jovens, foram detectadas lesões de alto grau. Vale lembrar que apenas as lesões de alto grau têm potencial oncogênico relevante. Nas outras 22 jovens, o exame mostrou "alteração escamosa de significado indeterminado", ou seja, o exame detectou alguma anormalidade, mas não identificou se era lesão de baixa gravidade ou outro problema.
Denise observou ainda a incidência de 24,1% de lesões cervicais no primeiro ano de atividade sexual e a redução nos quatro anos subsequentes, com variação entre 3 e 8%. Os dados apontam que a maioria das lesões regride com o tempo em grande número de casos, assim como é observado em outras faixas etárias. “Nosso trabalho reforça a importância da detecção precoce das lesões nas adolescentes, o que seria viabilizado pelo acesso dessas jovens sexualmente ativas aos programas de rastreamento, minimizando o impacto sobre sua saúde sexual e reprodutiva”, destaca a médica.
Vulnerabilidade típica da idade
A especialista explica que as adolescentes são mais vulneráveis a qualquer doença sexualmente transmissível, não apenas ao HPV. “Como o primeiro contágio por HPV ocorre mais frequentemente no início da vida sexual, do mesmo modo que a maioria das doenças sexualmente transmissíveis, a prevalência do vírus entre os jovens é maior”, explica a médica. “Por isso, é importante realizar periodicamente o exame preventivo, porque através dele conseguimos identificar as lesões pré-cancerosas para que elas não evoluam para um câncer de colo de útero”, acrescenta.
A médica diz ainda que grande parte dos casos de infecção por HPV não causa sintomas. Entretanto, nos casos persistentes, pode levar ao desenvolvimento de lesões que antecedem o câncer do colo do útero. “Felizmente, confirmamos grande taxa de regressão dessas lesões, mesmo nos casos de lesões de alto grau, que alcançou 50% e nas de baixo grau conferimos até 90%. No Brasil, estima-se que 3% das mulheres infectadas por um tipo viral oncogênico poderá desenvolver câncer de colo uterino quando não são adotadas medidas preventivas”, destaca Denise.
A estimativa do Instituto Nacional do Câncer (Inca) é que se possa reduzir 80% da mortalidade por câncer cervical pelo rastreamento adequado da doença com o teste de Papanicolaou e tratamento das lesões com alto potencial de evoluírem para malignidade. “Como o primeiro contágio com o HPV ocorre mais frequentemente no início da vida sexual, do mesmo modo que a maioria das doenças sexualmente transmissíveis, a prevalência do vírus entre os jovens é maior”, explica a médica.
Em uma pesquisa anterior, também realizada com pacientes do Hospital de Jacarepaguá, Denise destaca a importância de não associar a doença exclusivamente à promiscuidade, pois a maior parte das pessoas entra em contato com o vírus no início da vida sexual e não apenas porque teve muitos parceiros. Outro erro é a mulher que faz o exame regularmente achar que, necessariamente adquiriu a doença recentemente ou que foi infectada pelo último parceiro. “Os sinais da infecção pelo HPV podem aparecer em qualquer momento da vida, semanas ou anos após a contaminação. É importante que a lesão de alto grau seja diagnosticada e tratada, impedindo que evolua para o câncer de colo uterino”, ressalta a ginecologista.
Outro estudo desenvolvido pela pesquisadora Michele Pedrosa da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e doutoranda da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp), da Fiocruz, revela que entre os exames de Papanicolaou realizados em mulheres adultas (com idade igual ou superior a 20 anos), 5,6% possuíam alterações no colo do útero. Nas adolescentes, esse percentual foi maior, chegando quase a 9%.
Esta pesquisa mostra que a frequência das lesões precursoras do câncer cervical vem crescendo entre a população de adolescentes, possivelmente em consequência da diminuição da idade de início da vida sexual e do aumento no número de parceiros sexuais. As pesquisadoras analisaram o comportamento das lesões precursoras do câncer de colo uterino entre adolescentes do município do Rio de Janeiro. Foram estudadas 1.516.407 exames citológicos provenientes de unidades do Sistema Único de Saúde (SUS), entre 1999 e 2005, e comparadas a distribuição das alterações citológicas e a tendência temporal da distribuição entre adolescentes e mulheres adultas. No período, a prevalência de alterações cervicais em adolescentes duplicou, passando de 6,4% para 12,4%, enquanto, enquanto nas mulheres adultas aumentou de 4% para 6,1%.
Desafios no combate à doença
Para Denise, a saúde dos adolescentes constitui grande desafio para a saúde pública, uma vez que ainda há dificuldade em relação ao acesso a informações e serviços adequados para o atendimento de suas necessidades em saúde sexual e reprodutiva. Outra questão que preocupa a pesquisadora é o fato da pessoa com HPV não apresentar sintomas que levem a jovem a procurar tratamento médico, com exceção dos casos em que aparecem verrugas genitais.Apesar de também serem vítimas do HPV, os homens sofrem menos com a doença. O risco de câncer de pênis é muito inferior ao do colo uterino. Os únicos sinais, quando eles aparecem, são verrugas. Por isso, muitos portadores podem nunca saber que têm o vírus, aumentando as chances de transmissão. Porém, o uso da camisinha diminui bastante a possibilidade de transmissão na relação sexual e, apesar de não evitar totalmente o contágio, é recomendado em qualquer tipo de relação sexual, mesmo entre casais estáveis.
Prevenção
Existem mais de 100 tipos de HPV, dos quais 40 infectam a região genital. Destes, 15 podem estar associados à ocorrência de câncer. A maioria das infecções é ocasionada por apenas quatro tipos de HPV: os tipos 16 e 18 (de alto risco) são responsáveis por 70% dos casos de câncer de colo de útero e os tipos 6 e 11 (de baixo risco), causam 90% das verrugas genitais. Para a pesquisadora, a vacinação se constitui em uma nova arma para prevenir o câncer de colo do útero, já que o uso do preservativo não previne totalmente contra o vírus, apesar de proteger de forma eficaz contra muitas outras doenças de transmissão sexual, inclusive a Aids.
A médica explica que existem duas vacinas contra a infecção por HPV, ambas profiláticas e, portanto, devem ser aplicadas preferencialmente antes de iniciada a atividade sexual. “Embora as vacinas sejam eficientes, a rotina do exame preventivo deve continuar, pois nem todos os tipos de HPV são prevenidos pela vacinação”, alerta Denise.
Abril 2009
(crédito: matéria extraída do site http://www.iff.fiocruz.br/)
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