Sair à rua com vestimenta branca usada no hospital pode gerar contaminação por micro-organismos
PATRÍCIA CERQUEIRA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Uma nuvem cinzenta paira sobre o branco dos jalecos que protegem a roupa dos profissionais da saúde de vírus e bactérias. Como podem ficar impregnados desses micro-organismos em ambientes com alta capacidade de contaminação, seu uso é restrito.
Segundo a portaria número 485 do Ministério do Trabalho e Emprego, "os trabalhadores não devem deixar o local de trabalho com os equipamentos de proteção individual e as vestimentas utilizadas em suas atividades laborais".
Mas a regra não é obedecida à risca, afirma Edson de Oliveira, presidente do CFM (Conselho Federal de Medicina). É comum ver, nas ruas próximas a hospitais brasileiros, funcionários circulando com a indumentária.
Para Oliveira, os profissionais fazem isso por hábito. "E talvez por desconhecerem que a roupa pode ser um meio causador da transmissão de doenças", diz.
Outra questão levantada pelos especialistas ouvidos é o fato de a maioria dos hospitais brasileiros não ter um vestiário seguro -com itens como cadeados- onde os funcionários possam se trocar, algo que também é exigido pela legislação.
"No complexo do Hospital das Clínicas de São Paulo, ainda não temos esse espaço para todos. Uma comissão estuda onde serão construídos os vestiários", diz Tânia Mara Strabelli, presidente da subcomissão de controle de infecção hospitalar do InCor (Instituto do Coração). Os laboratórios de análises clínicas do HC, sensíveis a contaminação, já estão adequados. "Todo funcionário tem avental e cabides individuais, onde a vestimenta é colocada no fim do expediente."
Não se sabe a dimensão do risco de contaminação, pois faltam estudos sobre o tema. Mas a discussão sobre a possibilidade de a roupa levar micro-organismos para a rua tem movimentado o universo hospitalar.
Na Inglaterra, o jaleco de manga comprida -onde há mais risco de ocorrer contaminação- foi abolido das UTIs no início do ano, assim como o uso de relógios, crachás, gravatas ou qualquer acessório que fique pendurado.
"Os locais mais suscetíveis para esses micro-organismos se alojarem são mangas, bolso e gola das roupas", diz o microbiologista e biomédico Roberto Martins Figueiredo. Numa pesquisa informal, em 2008, ele colheu amostras do bolso do avental de cerca de 20 médicos que circulavam pela rua com a vestimenta. "Em oito delas, havia superbactérias, aquelas resistentes ao ambiente hospitalar", diz ele.
"O avental oferece risco de contaminação. Mas, com certeza, é um risco muito menor do que aquele oferecido pela não lavagem das mãos ou por ambiente hospitalar sujo, com macas de pacientes coladas umas às outras", diz Strabelli.
Ela alerta para a necessidade de diferenciar o avental usado como proteção individual do jaleco branco que é uniforme. O primeiro deve ser cedido pelos hospitais e ser fechado na frente. O segundo é uniforme para identificar o profissional.
No InCor, segundo Strabelli, até as secretárias usam aventais por ser uniforme de trabalho. "Elas não têm contato com fluidos biológicos contaminados (sangue, urina, fezes). O risco de levarem micro-organismos para a rua é zero."
A médica explica que a roupa utilizada em ambientes com alta capacidade de contaminação, como laboratórios, UTIs ou centros cirúrgicos, precisa de controle, algo que ocorre nos hospitais de referência. "Já o jaleco de quem fica na burocracia, visita pacientes menos graves e não tem contato com micro-organismos não oferece risco. A questão não pode ser superdimensionada", diz.
Para evitar confusão, o CFM recomenda que os médicos tenham um jaleco para circular nos hospitais e outro para usar no consultório. E que não levem a vestimenta para casa.
São Paulo, quinta-feira, 18 de junho de 2009
FOLHA DE S.PAULO equilíbrio
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/equilibrio/eq1806200910.htm
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